A luz cega pela manhã,
sempre estava acesa. Ela desfilava pelo palco do candeeiro, e seu fôlego era a
querosene, da bodega de seu Alfredo, onde Tonho, Ia, Pedro, Batista e eu íamos buscar.
Cuidadosamente, as mãos
macias de minha mãe, as mesmas que me acariciavam o rosto, nunca deixava a luz
morrer, sempre lhe acrescentava mais lãs.
Caminhava até o pasto, onde
tínhamos três vacas, Malhada, Margarida e Marieta. Elas nunca nos deixaram sem
leite, quando acordávamos, mamãe estava mexendo o leite, que pulava insistentemente, na panela de barro.
Antes de colocar a farinha,
para fazer a nossa papa – que chamávamos de escadado – , ela colocava umas
pitadas de sal.
Sentávamos sempre em
círculo, no chão áspero, mas bem limpo. Mamãe nos servia, em pratos de alumínio,
e antes dela assoprar a luz, que nos fazia companhia, Brázio passava em nossa
casa e, subia com papai para a roça.
Mamãe era sempre a primeira
a acordar, o galo por mais pontual, e cheio de vida que fosse, para ela estava
sempre atrasado.
Quando cantava, mamãe já
tinha voltado com a água, que pegara da cacimba, que ficava perto da casa, da
tia Neguinha. Era ali que passávamos o dia, embaixo do pé de Juá, uma tigela
com água perto do tronco, para os perus não morrerem de cede.
Meus primos Riva, Roberto e
Vanda nos esperavam com uma bola de meia – cheia de papel e plástico - , às
vezes jogávamos, às vezes corríamos dos perus.
Quase não sentíamos fome,
era Eninha e Neginha, que alumiava nossas ideias.
– Havia meninos, que a comida está pronta!
E voltávamos para a brincadeira. E só parávamos, quando
Migué e Brázio passavam, com as inchadas sobre os ombros, o sol já estava
cochilando. E víamos uma luz cega, no batente de casa nos esperando.
Tenho saudades das mãos
macias, tenho saudades dos gritos, que me alumiava. As lãs se acabaram mamãe...
é sempre gostoso comer escadado sobre a luz cega, em Cacimba de Dentro.